sábado, 10 de janeiro de 2015

As Avós


Um amigo mandou-me este vídeo ( link aqui para o caso de não conseguirem ver). Gostei tanto e lembrei-me de um post que fiz para o outro blog sobre a minha Avó.
Era assim...

A minha Avó Ema fazia anos hoje se fosse viva. Dia 22 de Abril. Não sei quantos, porque nunca me consigo lembrar se ela nasceu em 1920 ou em 1922. Mas lembro-me de muitas outras coisas. Lembro-me que ela tinha as mãos sempre quentes, o que era bom porque eu tinha (e tenho) as mãos sempre frias e ela envolvia as minhas mãos com as dela e o mundo inteiro ficava mais quentinho.
A minha Avó começou a trabalhar ainda em criança para ajudar a mãe. Formou-se em Química no Instituto Industrial de Lisboa, que é agora o ISEG. E fazia testes e análises químicas num laboratório.
Já eu começava a embirrar com a matemática na quarta classe e ela ainda sabia fazer a prova dos nove, as multiplicações e tudo o mais a uma velocidade estonteante. E dizia sempre: " um dia hás-de aprender o que é o seno e o co-seno". 
Infelizmente não, Avó! Quem saiu a ti na aptidão para a matemática foi o meu irmão. E, com sorte, talvez a minha sobrinha que vai ter o teu nome.
A Avó Ema era simultaneamente uma cientista e uma mulher crente. Quando eu cheguei ao 8º ano e tive Físico-química, ela gabava-se de ainda saber a tabela periódica de cor e salteado mas quando eu ou o meu irmão tínhamos testes ela rezava um terço a pedir boas notas.
Lembro-me da minha Avó como uma senhora elegante. Usava as saias com comprimento por baixo dos joelhos, como era típico dos anos 50, camisas impecavelmente engomadas e quase sempre o mesmo perfume. Ainda vestia combinações e saiotes como no seu tempo e eu ficava fascinada com aquelas peças de roupa rendadas e perfumadas. E a laca Elnett? Adorava vê-la a pôr aquilo no cabelo. Lembro-me, também, do colar de pérolas que ela tinha sempre ao pescoço.
A minha Avó, o esplendor máximo da educação, dizia "se faz fineza" em vez de se faz favor. Por exemplo: "um café, se faz fineza". Ordenava com delicadeza "senta-te direita, como uma menina" e "penteia-te, filha". Fazia-me cumprimentar os vizinhos. Não nos fazia comer nada de que não gostássemos mas se dizíamos " não gosto" ela apressava-se logo a lembrar-nos de que se o nosso Avô fosse vivo não admitiria. Dizia-se "não aprecio".
A Avó Ema era tão teimosa como generosa. No aniversário do meu irmão oferecia-me uma prendinha também e vice-versa. Era para não ficarmos tristes. Mas nunca quis ir viver connosco, mesmo quando talvez fosse melhor, mais confortável, para ela.
A minha Avó era ao mesmo tempo moderna e conservadora. Trabalhou e estudou quando a maior parte das mulheres ficava em casa mas nunca foi feminista e achava que uma mulher devia andar arranjada em todas as circunstâncias. Detestava as minhas jardineiras pretas e as botas da tropa porque não eram próprias de uma jovem mas ofereceu-me as minhas segundas Doc Marten's. Aliás, atendia sempre aos nossos pedidos mais estapafúrdios com "se a Avó puder".
Não era de humor fácil mas quando se ria com alguma coisa rematava "que disparate".
Era a amiga que me contava o episódio perdido da telenovela e quem tinha dormido com quem e a avó que transformava os bifes intragáveis que a minha Mãe deixava para o almoço (desculpa Mommy, mas eram mesmo) em hamburgers deliciosos, me enchia de bolachas e me deixava ficar no banho de imersão e encher a banheira as vezes que quisesse até toda eu parecer uma uva passa. Esta mania dos longos banhos de imersão tem uma explicação. A minha Avó tinha uma banheira vitoriana e uma touca de banho extraordinária cheia de franzidos e com uma flor enorme. Mais do que uma touca de banho era quase um chapéu de cerimónia. Isto fazia com que a hora do banho fosse uma verdadeira festa.

A Avó Ema. A minha Avó. A minha vovó. A mulher que mais me ensinou sobre a vida a seguir aos meus pais. Guardo a tua memória com estima, amor, amizade, com profundo respeito e admiração. Estás comigo todos os dias.

Nesta altura ainda não sabia que o meu irmão, num gesto bonito, chamaria Emma à minha sobrinha.